Chega de crimes ambientais: não à cava subaquática de Cubatão!
O meio ambiente no Brasil sofre cada vez mais com o capitalismo predatório, extrativista e nada sustentável. O lucro vem acima da vida e da proteção ambiental. Exemplos recentes, lamentavelmente, não faltam. Em 2015, o rompimento da barragem em Mariana ceifou vidas e destruiu a bacia do rio Doce. Agora, a tragédia em Brumadinho afogou […]
25 de fevereiro de 2019
O meio ambiente no Brasil sofre cada vez mais com o capitalismo predatório, extrativista e nada sustentável. O lucro vem acima da vida e da proteção ambiental. Exemplos recentes, lamentavelmente, não faltam. Em 2015, o rompimento da barragem em Mariana ceifou vidas e destruiu a bacia do rio Doce. Agora, a tragédia em Brumadinho afogou na lama ao menos 310 pessoas, das quais 141 ainda não foram localizadas. Por trás dos dois crimes está a Vale do Rio Doce que, privatizada, ignora protocolos de segurança, corrompe agentes públicos e age tão somente para favorecer seus lucros. A Vale é ícone da selvageria extrativista.
No entanto, o meio ambiente não está ameaçado somente pelas barragens, que agregam os resíduos da atividade mineradora. Áreas de preservação natural são violadas pela fúria dos latifundiários, que atropelam fronteiras agrícolas para exportar os seus grãos. Terras são e podem ser devastadas por hidrelétricas. As cidades já sofrem com desequilíbrios causadores de diversas patologias.
Cubatão, cidade considerada a mais poluída do mundo até os anos 1980, recebe hoje uma forma de ameaça menos conhecida, mas tão grave e perigosa quanto as citadas acima: uma cava subaquática. Cava é um grande buraco perfurado artificialmente embaixo da água para armazenar resíduos dispensados de algum tipo de atividade humana.
Nesse caso específico, a cava foi feita sob a responsabilidade da VLI Multimodal S.A. (Valor da Logística Integrada, empresa ligada a Vale responsável pela logística do Grupo) e da Usiminas (siderúrgica). Ambos os grupos têm interesse na ampliação do terminal portuário Tiplam (controlado pela VLI), localizado no estuário do porto de Santos, mais especificamente no canal Piaçaguera. Para aumentar em até seis vezes a capacidade do terminal, operaram uma obra de dragagem do canal, de modo a permitir o fluxo de navios maiores.
Ocorre, entretanto, que a movimentação de terras operada pela dragagem tem consequências ambientais muito graves. Essa terra condiciona resíduos da atividade industrial desde quando Cubatão era conhecido por “vale da morte”. Ao movimentá-la, espalha-se pela região material contaminado. Para piorar a situação, a VLI cavou um buraco de 25 metros de profundidade por 480 de diâmetro, maior que o Maracanã,
para depositar toda a terra contaminada retirada pela dragagem. Este buraco é a cava do Largo do Casqueiro.
Importante dizer que a sua localização está no lado cubatense do Canal Piaçaguera (linha azul), divisa com Santos, a 5 km do Centro de Cubatão, 5,5 km do Centro de Santos, a 3,2 km da área continental de São Vicente e a 8 km de Vicente de Carvalho. Não por outra razão, tal empreendimento tem causado imensa reação na baixada santista. Muita luta está ocorrendo contra esse flagrante crime ambiental.
A começar pela Vila dos Pescadores, que sofre mais diretamente com as consequências da cava. Esta região é de mangue e de muita vida marinha. Pessoas tiram o seu sustento da pesca e dos caranguejos. Os impactos da obra são sentidos diretamente. Muitos pescadores são obrigados a viajar para poder trabalhar, quando antes o sustento estava ao lado das casas. Ambientalistas, movimentos sociais e
sindicatos se juntaram à luta. O pesquisador e mestre em engenharia urbana, Elio Lopes, aponta que na área é possível encontrar benzopireno (hidrocarboneto aromático causador de câncer) e metais pesados, como chumbo e cádmio.
A maneira como a cova é supostamente protegida é de uma precariedade lamentável. Ao redor, na parte de baixo e nas laterais, uma manta a separa da areia. Por cima, uma espécie de cortina de argila. Não há a menor confiança de que esses isolantes sejam efetivos. Ao contrário, tudo indica que paulatinamente esse material contaminado é espalhado pela água.
Essa cava foi a primeira a ser construída. Há ainda outras duas: no Largo do Cubatão e no Largo do Caneu (esta em Santos). Inacreditavelmente, quem autorizou essas obras foi a CETESB (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo). O descalabro é tamanho que corre na Assembleia Legislativa pedido de CPI para investigar a CETESB em relação a possível lobby empresarial e omissões na emissão de laudo permissivo. Além disso, o primeiro EIA/RIMA autorizando a cava do Largo do Casqueiro é de 2005. A obra começou mais de dez anos depois, de tal modo que havia expirado a validade do documento.
Por essas e outras razões, o Ministério Público Federal também entrou na briga. Questionou a cava na Justiça e acionou contra a CETESB e a VLI. Outros órgãos também acompanham a situação, como o Ibama. Vale dizer que um dos responsáveis pelo enfraquecimento da CETESB é Ricardo Salles, que foi Secretário de Meio Ambiente condenado por crime ambiental. A dimensão dos desafios em defesa da sustentabilidade fica evidente quando vemos que o condenado de ontem é o ministro do Meio Ambiente de hoje.
A luta, todavia, continua. Na última sexta-feira, mais de 250 ativistas ocuparam a Câmara de Vereadores de Santos numa audiência pública, organizada pela vereadora Telma de Souza e pelo deputado João Paulo Rillo. A palavra de ordem era clara: a cava é cova. O movimento exige que o material despejado na cava seja retirado, tratado e colocado em local adequado. Nosso mandato se soma a essa luta. Não é possível
desenvolvimento sem sustentabilidade. Não podemos aceitar um lixão químico num braço de mar. Como afirmou Marly Vicente, líder comunitária da Vila dos Pescadores, “o poder econômico não pode estar a frente da vida”.