Servidores públicos novamente na mira

O governo Bolsonaro é a mistura torpe de autoritarismo com neoliberalismo tosco e não sabe o que fazer ao certo com alguns ícones do mercado, como a Regra de Ouro e o teto de gastos. Prestes a cometer crime de responsabilidade, e portanto, ser passível de impeachment, procura desesperado uma forma de legalizar seus atropelos […]

16 de outubro de 2019

O governo Bolsonaro é a mistura torpe de autoritarismo com neoliberalismo tosco e não sabe o que fazer ao certo com alguns ícones do mercado, como a Regra de Ouro e o teto de gastos. Prestes a cometer crime de responsabilidade, e portanto, ser passível de impeachment, procura desesperado uma forma de legalizar seus atropelos e ao mesmo tempo ainda não parecer menos liberal, para isso, o grande alvo são o funcionalismo e o patrimônio público.

A bola da vez é acelerar a tramitação da PEC 438/2018, com o apoio do Rodrigo Maia e setores mais à direita do Congresso. A PEC de autoria do deputado Pedro Paulo do DEM fluminense propõe uma série de ajustes a fim de que não se incorra em crime de responsabilidade fiscal. Aparentemente seria um avanço, uma vez que flexibiliza a chamada Regra de Ouro e demais regras fiscais, como a Lei de Responsabilidade e a Regra do Teto, todo esse receituário fiscalista tem demonstrado sua perversidade, não contribuindo para o reequilíbrio do orçamento público e aprofundando a recessão. No entanto, a questão não é tão simples assim, pois não se resume em flexibilizar elementos fiscais, mas em justificar com isso uma série de medidas altamente deletérias para os mais pobres, para o funcionalismo público e para o interesse nacional.

Veja alguns dos pontos, de forma resumida, que merecem destaque na PEC e que altamente prejudiciais ao povo brasileiro. São ajustes ainda mais draconianos em caso de descumprimento da Regra de Ouro:

  • Serão suspensos temporariamente os repasses do FAT ao BNDES;
  • Permissão para redução temporária da jornada de trabalho de servidores com adequação dos vencimentos;
  • Redução em pelo menos 20% das despesas com cargos em comissão e funções de confiança e exoneração dos servidores não estáveis;
  • Interrupção do pagamento do Abono Salarial no exercício financeiro subsequente;
  • Encaminhamento de PL pelo Poder Executivo com planos para alienação de ativos, inclusive mediante a cessão onerosa dos direitos originários de créditos tributários e não tributários inscritos em dívida ativa;
  • Cobrança de contribuição previdenciária suplementar provisória de 3 pontos percentuais dos servidores ativos, aposentados e pensionistas, assim como dos militares ativos e inativos;
  • Utilização de saldos positivos de recursos vinculados, verificados após o encerramento do exercício financeiro, para pagamento do serviço da dívida pública;
  • Redução em 10% das alíquotas das contribuições compulsórias dos empregadores sobre a folha de salários a que se refere o art. 240 da CF, com simultânea majoração da alíquota da contribuição social destinada à previdência social de que trata o art. 195, I, “a”, em percentual que equivalha ao montante que deixou de ser enviado ao chamado Sistema S.

Esse conjunto de medidas significa: o governo apronta e o povo paga a conta. Independente da lógica para a qual é usada na prática, o conceito de que o governo não pode contrair empréstimos para pagar despesas correntes é correto, na medida em que isso não implica em investimentos e crescimento, mas em mais endividamento. No entanto, é preciso ter claro que o modelo propositalmente engessa o setor público para que sobre dinheiro para o pagamento da dívida, em detrimento de um investimento púbico necessário que poderia resultar num real desenvolvimento do país.

As medidas da PEC radicalizam ainda mais essa situação. Num momento de crise, apertem se os cintos, mas não o cinto de todos, apenas dos que vivem do trabalho, os rentistas continuam passando ilesos e lucrando com a crise. Além disso, se criam situações ainda mais favoráveis para o lucro fácil, como por exemplo, a securitização da dívida ativa, no estilo “Black Friday” do patrimônio público. Haverá antecipação de caixa, que é o grande desejo de um governo sem dinheiro, mas e daí, o grosso significativo dos recursos passará para as mãos privadas. É o famoso vender o almoço para comprar o jantar.

As medidas são tão draconianas, que mesmo após uma feroz reforma da previdência, eles têm a cara de pau de propor cobrança de contribuição previdenciária extra, de 3 pontos percentuais dos servidores ativos, aposentados e pensionistas. No entanto, quando se fala de reduzir incentivos e benefícios de natureza tributária de que recorram renúncias de receita, o Projeto de Lei autorizado é de apenas 10%. Isso contrasta, com a desoneração fiscal atual: o montante de renúncia de receitas da União projetadas para 2020 é da ordem de mais de R$ 331 bilhões de reais. Isso corresponde a mais de 21% de toda a arrecadação federal, isto é, de recursos que poderiam estar sendo diretamente empregados pelo Poder Público.

É preciso barrar mais esse retrocesso e ataque aos direitos dos trabalhadores. O STF já foi claro em apontar a inconstitucionalidade da redução dos salários do funcionalismo. É preciso se colocar de forma clara contra mais essa manobra. Que Bolsonaro responda pela crise e por um modelo insano, que já provou suas consequências no aumento da miséria e na queda de arrecadação. Se ele vai cometer crime de responsabilidade, que esteja preparado para isso, mas não que vem com manobras para livrar a cara e ainda fazer com que o povo pague a conta. O povo não aceita mais o blá blá blá ideológico desse governo de incompetentes. Se não tem condições de governar, que peça pra sair, mas não exija mais sacrifício de um povo cada vez mais aviltado.

Ivan Valente PSOL/SP

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