Em defesa da Constituição, contra a redução de salário dos servidores públicos
Ontem completou um mês do crime de Brumadinho, uma tragédia anunciada que ceifou mais de 300 vidas, além da destruição ambiental e todo o impacto social, psicológico e econômico para os sobreviventes e a região. Quem foram os primeiros a prestarem socorro e que continuam com um abnegado trabalho na região? Os servidores públicos, bombeiros, […]
26 de fevereiro de 2019
Ontem completou um mês do crime de Brumadinho, uma tragédia anunciada que ceifou mais de 300 vidas, além da destruição ambiental e todo o impacto social, psicológico e econômico para os sobreviventes e a região.
Quem foram os primeiros a prestarem socorro e que continuam com um abnegado trabalho na região? Os servidores públicos, bombeiros, trabalhadores da saúde, assistentes sociais, polícia militar etc. Não foi a Vale, não foram os planos de saúde privados, foram os servidores que garantiram o pronto atendimento, inclusive, com o grave risco de contaminação por material tóxico dos rejeitos de mineração. Servidores, aliás, que não estão com seus salários em dia.
Bastaria só o exemplo da atuação dos servidores em Brumadinho, apesar de toda a importância dos trabalhadores públicos em nível nacional, para dizer que eles não podem continuar a ser o alvo das crises econômicas e fiscais, não podem ser demonizados, como faz agora o governo federal com a reforma da previdência.
No Brasil, virou rotina jogar a responsabilidade nos servidores, coloca-los como os grandes perdulários da máquina pública. Se esquecendo, de forma proposital, da dívida pública, dos juros acachapantes, das isenções fiscais e anistia às grandes empresas, da incompetência em combater a sonegação e cobrar os grandes devedores. Isso sem falar na corrupção, nos esquemas de desvios de dinheiro público via obras e contratos superfaturados e no loteamento dos cargos públicos em troca de apoio político.
Nesta quarta-feira, dia 27, o Supremo Tribunal Federal está diante de uma decisão muito importante, que diz respeito ao futuro do conjunto dos servidores públicos brasileiros, podendo ter implicação até mesmo para os servidores federais. O STF deve decidir se os estados poderão reduzir a jornada de trabalho e a remuneração de seu funcionalismo. Tal medida, se aprovada, vai prejudicar ainda mais a qualidade e a disponibilidade dos serviços públicos oferecidos à população, que será a maior prejudicada.
Vale ressaltar que muitos trabalhadores públicos já estão sem reposição salarial há anos, sofrem com atrasos e parcelamento do pagamento. A redução de salários, vai gerar problemas ainda maiores num atendimento que já está deficitário por falta de recursos, pessoal e estrutura.
Sete estados enviaram ao STF pedido do reestabelecimento da permissão de corte nos salários de servidores estaduais. Eles pedem que o STF retire a suspensão do artigo 23 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O artigo, que permite o corte nos salários dos servidores, está suspenso por medida cautelar (liminar). As alterações se deram em 2002, após ação movida no Supremo por partidos políticos. O processo está sob a relatoria do ministro Alexandre de Moraes.
Servidores públicos em vários estados estão mobilizados contra mais esse ataque e apontam as contradições dessa medida, inclusive o impacto negativo que pode ter nas economias locais. É o caso de Minas Gerais, que segue dando grandes isenções fiscais a empresas, apesar da crise financeira em que se encontra. Ou o caso do Rio Grande do Sul, segundo o CPERS (Sindicato dos Professores da rede estadual gaúcha), o estado teve recorde de arrecadação, mas não paga em dia seus funcionários. Relata o sindicato, enquanto os educadores gaúchos amargam 38 meses de salários atrasados e parcelados – e quatro anos sem reajuste salarial – o estado Rio Grande do Sul bateu recordes de arrecadação. O ICMS, principal item da receita tributária, cresceu 8,99% em 2018, totalizando R$ 34,8 bilhões. Isso representa um acréscimo de mais de R$ 2,8 bilhões sobre o ano anterior. O aumento também foi 5,38% superior à inflação e o total arrecadado ultrapassou a previsão orçamentária do ano em mais de R$ 2,2 bilhões.
Os Governadores fazem chantagem com a situação de crise dos seus estados, dizendo que é isso, ou os estados não terão condições de arcar com os seus funcionários. O próprio relator no STF, ministro Alexandre de Moraes, voltou a repetir o jargão, no estilo Bolsonaro, se os trabalhadores preferem perder o emprego ou terem a redução e assim continuarem empregados. Lembrando que a demissão só é prevista em casos bem específicos, precedidas de medidas claras adotadas pelo Estado e multa contratual, não é tão simples como o ministro apregoa.
Não obstante às chantagens, a Constituição é clara em relação a irredutibilidade dos salários. Não se pode resolver a crise econômica nos estados violando a Constituição para se obter isso. Não há malabarismo jurídico que resolva.
A crise dos estados virou moeda de troca e elemento de pressão no STF, como se atacar os direitos do funcionalismo fosse a única alternativa possível. É a mesma política adotada em relação à Reforma da Previdência, com o governo federal negociando ajuda aos Estados, em troca do comprometimento dos governadores em pressionar as bancadas de deputados federais em cada estado em favor da reforma.
O PSOL segue na defesa dos servidores, dos seus direitos e condições de trabalho e principalmente, na defesa da qualidade dos serviços públicos para a população. Assim como nos posicionamos recorrendo ao Supremo quando Michel Temer, em 2017, quis aumentar a contribuição previdenciária dos servidores de 11% para 14%, configurando um verdadeiro confisco salarial e violando a Constituição, uma vez que esse aumento não estava previsto, seguimos atentos a essa votação e esperamos que o STF tome a medida correta e não autorize a redução de salários.
O momento é de mobilização, de resgaste da importância e do papel dos serviços públicos. Assim como a Reforma da Previdência mira nos direitos dos trabalhadores e não mexe nos verdadeiros privilegiados, naqueles que ganham com a especulação financeira, com os juros altos e com as isenções e anistias patrocinadas às custas do serviço público, a redução de salários é a outra forma encontrada para desviar o foco, para não enfrentar a falência das contas públicas e do modelo econômico neoliberal que levou a mais recessão e crise.
Os trabalhadores não podem e não vão pagar a conta dessa crise.
Deputado Ivan Valente
Deputado Federal PSOL/SP